Ação para soltar Lula mostra que MPF precisa manter o controle sobre prisão, diz Lava Jato

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A força-tarefa do MPF (Ministério Público Federal) na Operação Lava Jato avalia que o episódio do “solta e prende” envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 8 de julho mostrou que há razões para que ele fique na Superintendência da PF (Polícia Federal) em Curitiba.

Há dois meses, o desembargador Rogério Favreto, durante um plantão do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), decidiu conceder liberdade a Lula após uma solicitação feita por deputados petistas.

Ao longo de todo aquele domingo, ações para manter a prisão e libertar Lula se sucederam, até que o presidente do TRF-4, desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, manteve o petista na PF.

“O episódio do desembargador Favreto mostrou que existem bons motivos para nós mantermos um controle sobre essa execução [da pena de Lula] para que não sejamos surpreendidos”, disse ao UOL o procurador regional Carlos Fernando dos Santos Lima. Ele e o coordenador da força-tarefa, o procurador Deltan Dallagnol, receberam a reportagem na sede do MPF em Curitiba na última segunda-feira (9).

A declaração de Lima foi feita em resposta ao questionamento da reportagem sobre a Lava Jato ter dito que Lula teria transformado a PF em um “comitê de campanha”.

No dia, Dallagnol diz que a Lava Jato atuou contra a liberdade de Lula “para que a sociedade pudesse continuar sendo resguardada com uma restrição de liberdade que entendemos adequada dentro do processo criminal após o julgamento em segunda instância”.

Houve uma série de decisões absolutamente atípicas do de desembargador Favreto, que fogem do padrão e de regras que deveriam reger a atuação

Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa do MPF na Lava Jato

Lima não chegou a atuar no episódio, mas considerou a ação de Favreto como “abusiva”. “Era necessário que a questão fosse decidida definitivamente naquele dia pela autoridade competente, que era o presidente do tribunal”, lembra o procurador regional.

“Tínhamos que imaginar o que seria se ele tivesse sido solto e depois refazer o processo de prisão, que já foi traumático”, pontua, lembrando que Lula demorou dois dias para se entregar à PF após a determinação do juiz federal Sergio Moro.

O UOL questionou se, na visão dos procuradores, o ex-presidente deveria ser transferido para outro local, como o CMP (Complexo Médico de Pinhais), na região metropolitana de Curitiba, e que tem recebido outros presos da Lava Jato.

Se estivesse no CMP, o controle da execução da pena de Lula poderia passar da esfera federal para a estadual, já que o presídio é de responsabilidade do governo do Paraná.

A execução da pena também iria para o TJ (Tribunal de Justiça) paranaense. Estando na PF, decisões a respeito da execução da pena de Lula ficam a cargo da Justiça Federal. Nessa esfera, o MPF pode se manifestar a respeito de decisões que envolvam a custódia de Lula.

Como exemplo para falar sobre a necessidade de a Lava Jato ter controle sobre a prisão de Lula, Dallagnol cita as regalias, como uma “sala de cinema”, que o ex-governador fluminense Sérgio Cabral (MDB) teve na Cadeia Pública José Frederico Marques, no Rio.

O MPF chegou a pedir que o político fosse transferido para Curitiba, o que aconteceu em janeiro deste ano. Em abril, por determinação do STF (Supremo Tribunal Federal), Cabral voltou ao Rio, mas para o presídio de Bangu, onde está até hoje.

Ao fazer uma relação com Lula ao comentar sobre o político do MDB, o coordenador da força-tarefa disse que o local da prisão deve evitar “práticas que foram verificadas no Rio de Janeiro, na área estadual do poder de influência que o governador Sérgio Cabral tinha”.

Menos de três semanas após a prisão de Lula, os dois procuradores já indicaram à juíza federal Carolina Lebbos, responsável pela execução da pena do petista, que era “difícil afirmar a existência de outro local no estado do Paraná” que pudesse “garantir o controle das autoridades federais sobre as condições de segurança física e moral do custodiado”. Ao UOL, eles reafirmaram que Lula deve ficar na PF.

“Mas ali, ainda que com suas dificuldades, tem sido um lugar em que ele tem sido resguardado com o direito e a dignidade da função que ele exerceu e, ao mesmo tempo, com controle da Justiça, ainda que muitas vezes o controle aconteça depois de determinados episódios terem se passado, mas isso é natural”, disse Dallagnol, referindo-se à crítica da Lava Jato às constantes visitas que Lula tem recebido de políticos na prisão.

“Já discutimos muito isso [transferência de Lula], mas ainda não vemos grandes alternativas”, comentou Lima.

Desde 10 de maio, Lebbos pode apresentar uma decisão a respeito de pedidos para que Lula seja transferido feitos pela prefeitura de Curitiba e moradores da região da sede da PF na capital paranaense. No processo, a defesa de Lula já se manifestou que, caso o ex-presidente seja transferido, que a pena passe a ser cumprida em São Paulo.

Frase persegue

Nesta sexta-feira (14), a apresentação em que a Lava Jato usou um PowerPoint para apresentar sua primeira denúncia contra Lula completou dois anos. E uma frase persegue os procuradores desde então: “não temos provas, mas temos convicção”.

Acontece que a declaração nunca foi feita, como os vídeos com a íntegra da apresentação atestam. A frase, porém, passou a ser compartilhada intensamente nas redes sociais e em blogs, e é usada até hoje.

Os procuradores, porém, já nem tentam mais explicar que a declaração nunca existiu. “É uma estratégia de repetir mil vezes até que pareça verdade. Nós levamos isso como uma parte da reação contra a investigação”, disse Dallagnol.

“Foi uma frase criada, inventada, e que circulou como se tivesse sido dita dentro de uma estratégia de comunicação muito bem montada nesse espectro de esquerda”.

Lula chegou a processar Dallagnol por causa do PowerPoint, mas teve sua ação negada pela primeira e segunda instâncias do TJ de São Paulo. Apesar das críticas que sofreu, o coordenador diz que faria a apresentação novamente porque ela foi uma “prestação de contas para a sociedade, como foi feito em diversos outros momentos”, mas faria pequenas alterações para tentar não deixar brechas.

“Isso não quer dizer que não fossem surgir outras interpretações críticas dada a repercussão do caso, dado o carisma que essa figura pública acusada tem junto a uma grande parcela da sociedade”.

Sem citar o ex-presidente, porém, os procuradores criticam políticos usam o apoio das urnas e da sociedade para dizer que “processos judiciais que apuram seus crimes ficariam sem valor”. “Quando uma coisa não tem nada a ver com a outra”, comentou Dallagnol.

“Começamos a deturpar a democracia ao aceitar que essa legitimidade momentânea, decorrente às vezes do excesso de recursos, dá a algumas pessoas. O que temos que pensar é que democracia só se faz dentro das regras da lei e não acima das regras da lei”, complementou Lima.

UOL