Procuradores das forças-tarefa da Lava Jato em Curitiba, no Rio de Janeiro e em São Paulo se reuniram nesta segunda-feira (27) na capital fluminense para lançar uma carta em que pedem apoio da sociedade à operação. No texto, batizado de “Carta do Rio de Janeiro”, os procuradores defendem que a possibilidade da responsabilização de políticos influentes tem unido grande parte da classe política contra a operação, ameaçando as investigações.
“As maiores ameaças à Lava Jato vêm do Congresso Nacional”, afirmou Deltan Dallagnol, procurador que está à frente dos investigadores em Curitiba, ao comentar que há muitos políticos investigados e que é natural que exista um instinto de “autopreservação” entre eles.
“A Alerj [Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro] é a amostra do que está por vir se nada mudar em 2018”, disse Dallagnol.
Jorge Picciani, chefe da Casa, e outros dois deputados também do PMDB, Paulo Melo e Edson Albertassi, foram presos por suspeita de favorecerem empresários na Alerj. Entretanto, o plenário do Legislativo fluminense votou pela revogação das prisões e os parlamentares foram libertados cerca de uma hora depois. O TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) decidiu, contudo, decretar novamente a prisão dos deputados porque a Casa não comunicou os desembargadores sobre a revogação das detenções.
Segundo os procuradores, atuações de Comissões Parlamentares de Inquéritos e em diversos projetos de lei ameaçam as investigações. O fórum privilegiado garantido a políticos em exercício é um exemplo de desafio enfrentado pelos investigadores, afirma o coordenador da Lava Jato no Rio, Eduardo El Hage.
“É crucial que em 2018 cada eleitor escolha cuidadosamente, dentre os diversos setores de nossa sociedade, apenas deputados e senadores com passado limpo”, traz o documento divulgado nesta segunda-feira.
Dallagnol, no entanto, negou que haja entre investigadores integrantes interessados em disputar eleições ou fazer parte da elite política do país.
“Apenas a Lava Jato recuperou para os cofres públicos R$ 700 milhões. A maior dificuldade é o sistema de justiça inoperante. Os grandes casos de corrupção demonstram isso. Quando observamos a atuação do STF percebemos falta de resolutividade (incapacidade de resolver). Não pela ação dos juízes, mas pelo sistema”, disse Dallagnol.
Os procuradores também falaram que a iniciativa das dez medidas contra a corrupção apresentada ao Congresso Nacional foi descaracterizada.
2018: a batalha final
Para Dallagnol, “2018 é a batalha final da Lava Jato porque vai determinar o futuro da luta da corrupção”.
“As eleições de 2018 determinarão o futuro da luta contra a corrupção do nosso país. Deputados federais e senadores que determinarão se existirão ou não retrocessos na luta contra a corrupção e se existirão reformas e avanços que possam nos trazer um país mais justo com índices efetivamente menores de corrupção e de impunidade”, afirmou.
Ele defendeu a necessidade de apoio às investigações frente ao tamanho que a operação alcançou. Segundo o procurador, é preciso que a sociedade entenda que o Judiciário é uma das pontas do combate à corrupção no país e eleja um Congresso capaz de fazer jus ao seu dever constitucional.
O futuro da Lava Jato será sombrio, se não elegermos um outro Congresso.
Deltan Dallagnol, procurador
Dallagnol fez ainda um paralelo com a italiana Mãos Limpas que, segundo ele, tinha um grande apoio da sociedade, mas acabou eclipsada quando uma parcela dos políticos atingidos pela operação conseguiu mudar o foco do combate à corrupção para o combate a supostos abusos de poder do Judiciário.
O procurador citou como exemplo o projeto das dez medidas contra a corrupção
Os procuradores também defenderam as delações premiadas, definidas Dallagnol como “motor de propulsão” da operação.
Eles ressaltaram a necessidade de respeitar os acordos de delação premiada firmados com os investigados. Segundo o procurador José Augusto Vagos, “a colaboração é uma das mais importantes técnicas de investigação”.
Recentemente, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), devolveu a delação premiada do marqueteiro Renato Pereira, que trabalhou para o PMDB, para a PGR (Procuradoria-Geral da República) fazer ajustes nos benefícios concedidos ao colaborador. Ele tirou o sigilo e não homologou o acordo.
Os procuradores também consideram que é preciso dar tempo para que as novas chefias tanto da PGR quanto da Polícia Federal se adaptem. “Toda mudança tem um tempo de maturação, adaptação. É natural. Temos visto manifestações muito positivas da doutora Raquel Dodge. Quanto à PF, precisamos ver como ela vai atuar”, afirmou o procurador da força-tarefa em Curitiba Carlos Fernando dos Santos Lima.
Ao assumir o cargo no início do mês, o diretor-geral da PF, Fernando Segovia fez críticas à investigação que apontou o envolvimento do presidente Michel Temer (PMDB) em corrupção. As suspeitas contra Temer foram afirmadas por relatório da própria PF que embasou uma das denúncias contra o presidente.
“A gente acredita que, se fosse sob a égide da Polícia Federal, essa investigação teria de durar mais tempo, porque uma única mala talvez não desse toda a materialidade criminosa que a gente necessitaria para resolver se havia ou não crime, quem seriam os partícipes e se haveria ou não corrupção”, disse Segovia, em entrevista na última segunda-feira (20). “É um ponto de interrogação que fica hoje no imaginário popular brasileiro e que poderia ser respondido se a investigação tivesse mais tempo”, afirmou o chefe da PF.
Confira abaixo a carta divulgada pelos procuradores:
“Carta do Rio de Janeiro”
UOL Notícias